quinta-feira, 14 de setembro de 2017

BIOGRAFIA DE UMA REVISTA (NAQUELES TEMPOS DA ARTE QUINTAL)

No momento estou escrevendo meu próximo livro para 2018. Trata-se da história de uma revista criada por mim e outros amigos em 1983 e que, mesmo sem internet naquela época, tornou-se conhecida como referência cultural nacionalmente. Revelamos vários artistas desconhecidos, alguém famoso na capa para vender e o leitor levando a revista, leria entrevistas com esse alguém de renome e o outro alguém desconhecido. Artistas de todo o país quando vinham à capital mineira, visitavam três lugares: o Palácio das Artes, o Suplemento Literário do Minas Gerais e a Revista Arte Quintal, cuja sede ficava na Rua Carijós, 150 – Sala 803. A revista fechou as portas em 1992, em pleno Plano Collor. Abaixo trechos deste livro, ainda sem revisão, para a leitura dos curiosos. (Rogério Salgado)

“Neste ano de 1982 conheci Ecivaldo John, que morava na Av. Gal. Olímpio Mourão Filho nº 122, apartamento 101 A, no Planalto, local que seria o primeiro endereço do futuro jornal que ele iria criar comigo. Conheci depois Virgínia Reis e começamos a namorar com certo entusiasmo de juventude, pois apesar de estar nos meus 28 anos, era de certa maneira, um adolescente. Eu entusiasmado por namorar uma estudante de medicina bem bonita e ela por namorar um poeta. Dizem que até hoje não envelheci, por causa do frescor da juventude que levo dentro de mim.
Juntamos meu sonho com a garra que ela tinha e a alegria e entusiasmo do Ecivaldo. Num dos nossos primeiros encontros, fomos eu, ela e Ecivaldo numa corrida de Motocross na Serra do Cipó, ver velocidade e poeira misturar-se aos nossos ideais. Decidimos então, fazer pedágios em semáforos e vendermos rifas nas imediações do bairro, para juntar dinheiro. A gente deixava de curtir nosso fim de semana, para nos dedicarmos e essa empreitada. Cada pessoa que nos ajudava nos pedágios ou comprando nossa rifa, recebiam um folheto com o texto escrito por nós três (...).
O número zero saiu dia 13 de março de 1983. Fizemos um lançamento no bar Nós Todos. Só que dessa vez, foi um sucesso, pois o local ficou lotado. Todos queriam conhecer aquele novo jornal-revista que trazia uma proposta nova, diferente.
A partir do dia seguinte, saímos vendendo de mão em mão nos bares, nas noites da capital mineira. Este nº zero vinha com uma arte na capa feita pelo Clifor Andrade, um garoto talentosíssimo de apenas 15 anos e que atualmente é um senhor dentista, com consultório no bairro Planalto. Lembro que sua mãe ficou decepcionada, pois achava que seu filho iria receber pela arte para a nossa capa. Nós não tínhamos nem para pagarmos direito a gráfica, quanto mais para pagarmos ao Clifor pela sua arte. Ou seja, ficou na colaboração.
Na capa tinha um desenho do Charles Chaplin, o homenageado desta edição.(...)
E assim seguimos com nossa vontade de não deixarmos a peteca cair. E para a edição de nº 2 Wagner sugeriu Marco Antonio Araújo, um músico instrumental mineiro, que estava sendo reconhecido nacionalmente. Virginia sugeriu Sara Amorim que era a editora do jornal Nossa Música, a qual muitos achavam que éramos concorrentes e para quebrar essa barreira, fizemos uma matéria com a Sara na nossa revista e ela fez uma matéria conosco para a sua revista, tipo uma troca de gentilezas. Meu amigo jornalista Adair José nos ofereceu uma entrevista que ele tinha feito com a artista plástica Yara Tupinambá, a qual aceitamos de bom grado e Wagner sugeriu Rubinho do Vale. Nesta edição, logo abaixo do editorial escrevemos um texto falando sobre as eleições diretas em 1985. Ali, quase sem perceber, começávamos a nos envolver politicamente. Dedicamos a edição a John Lennon e incluímos a letra de “Imagine” traduzida. Nesta época, vários artistas mineiros, incluindo nós da Arte Quintal, já nos reuníamos no Teatro Marília e na sede da Apated para discutirmos as eleições diretas. Queríamos um presidente que fosse eleito por nós, mesmo se errássemos ou acertássemos, queríamos ser os donos da história e naquele finalzinho de ditadura, ainda éramos impedidos de criarmos o futuro desse país. Queríamos o verdadeiro sentido da liberdade correndo em nossas veias.(...)
Dia 27 de agosto de 1991, apesar das estarmos passando sérias dificuldades, fizemos um show no extinto Cabaré Mineiro, para comemorar os oito anos da Arte Quintal, com a presença de músicos e poetas que doaram a bilheteria para ajudar a Editora. Foram eles Marku Ribas, Ladston do Nascimento, Cynthia Martins & Marcus Bolivar, Sheyla Araújo, João Bosco & Ilca e Zé Baliza & Bajaré. João Boamorte não compareceu por problemas de saúde, vindo a falecer logo depois. O jornal Minas Gerais publicou matéria sobre o evento.
E foi aí que o Wagner teve a idéia de dar uma última cartada: a produção de uma antologia de contos mineiros intitulada “Flor de vidro”, título de um conto inédito de Murilo Rubião, gentilmente cedido pela sua família para nos ajudar, assim como dos outros autores que abriram mão de seus direitos autorais. O livro considerado uma importante reunião de autores mineiros, desde veteranos a estreantes teve seu lançamento oficial no Projeto Minas Escreve, da Caixa Econômica Federal dia 16 de dezembro de 1991, mas poucos exemplares foram vendidos, apesar de sua enorme importância para a literatura brasileira, como um divisor de águas na editoração de livros de contos na história da literatura nacional. Foram 48 autores entre desconhecidos e consagrados, numa reunião de quatro gerações, juntando realismo fantástico, pop, erótico, impressionismo, pós-moderno, num livro que marcou uma época. Organizado pelo Wagner com uma pequena ajuda minha (...)”


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